sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Entradas e Bandeiras- FAEMA lança campanha de ódio contra os Awás Guaj


Por Diogo Cabral



A famigerada FAEMA, organização sindical patronal que congrega membros virtuosos da União Democrática Ruralista-UDR ( aquela que faz leilão para comprar armas para assassinar índios) resolveu lançar campanha de ódio contra a étnia Awá Guajá, a tribo mais ameaçada do mundo, cujos membros, caçadores e coletores, vivem na amazônia maranhense.

Num blog denominado propositadamente de Questão Indígena (http://www.questaoindigena.org), a FAEMA e seus propaladores plantonistas pregam a resistência face à desintrusão da T.I Awá Guajá. Além, anunciam aos quatro cantos do mundo que agora defendem os pequenos produtores rurais (posseiros e sem terra), visto que a FETAEMA e a CONTAG abandonaram os lavradores.

Neste jogo de palavras, a FAEMA incorre em várias mentiras: a primeira, em relação à FETAEMA e à CONTAG, que, ao lado do STTR de Zé Doca e da Coordenação Sindical do Alto Turi, tem participado de várias audiências junto ao INCRA, TERRA LEGAL, ITERMA e GOVERNO DO MARANHÃO, objetivando o assentamento das 200 famílias de lavradores que ocuparam a TI há pouco mais de duas décadas.

Outra mentira é facilmente detectada quando a FAEMA afirma defender os lavradores. Óleo não se mistura com água, por isso devemos destacar que a região onde se localiza a TI Awá Guajá esconde em seu subsolo reservas auríferas, além da riqueza da floresta. No momento em que a TI é ''concretizada'', os 118 mil hectares de florestas saem do mercado de terras, impedindo que grandes proprietários comprem direitos possessórios ou reais de qualquer natureza. Não são os lavradores que defende a FAEMA, mas o palmo de terra que ocupam.

Devemos adentrar na história para entender a atual campanha de ódio lançada contra os Awás, patrocinada pela FAEMA

A presença dos Awá Guajá na região do alto Rio Caru e afluentes do rio Gurupi é conhecida desde 1835 através de um Relatório do Presidente da Província do Maranhão. A informação foi confirmada por outros estudos de viajantes e por velhos índios Guajajara que coabitam a região. Esses dados fazem parte de um estudo da Funai sobre a terra dos Guajá.

O decreto do então presidente Jânio Quadros, que criou em 1961 a Reserva Florestal do Gurupi com 1.674.000 hectares, veio confirmar as terras indígenas na região. O decreto tem um artigo que diz: “Dentro do polígono da Reserva Florestal serão respeitadas as terras de índio, de forma a preservar as populações aborígenes, de acordo com preceito constitucional e a legislação específica em vigor, bem como os princípios de proteção e assistência aos silvícolas, adotados pelo Serviço de Proteção aos Índios”.

Desde 1985, quando foi identificada pela Funai, com 232 mil hectares, a TI Awá teve delimitações diferentes. Em maio de 1988, uma portaria interministerial nº 76 declarava de posse permanente dos Guajá, 147.500 hectares, ou seja, diminuiu a área considerada pela Funai. Em setembro do mesmo ano, outra portaria interministerial, a de nº 158, revogava a portaria 76 e declarava de posse permanente indígena, 65.700 hectares. Em maio de 1990, a portaria nº 448 interditou 18. 750 hectares contínuos aos 65.700 hectares, totalizando 84.450 hectares. Finalmente, depois de reduções e acréscimos, a extensão da TI Awá foi declarada pela portaria do então ministro da Justiça, Celio Borja nº 373, de 27/07/1992, com 118.000 hectares.

Essas alterações de extensão revelam as pressões que o procedimento dermacatório da terra dos Guajá sofreu, e que continuou após a última declaração de posse permanente indígena.
Segundo informações contidas em documentos da Funai, em outubro de 1992, a Cia Agropecuária Alto Turiaçu obteve liminar favorável em Mandado de Segurança impetrado contra a Portaria n.373/MJ/92 que lhe permitiu permanecer na TI Awá.
Em fins de 1994 foi iniciado o trabalho de demarcação física da TI Awá, com base na portaria 373/92. Porém, a equipe que realizava o trabalho foi impedida por moradores da região de continuar a demarcação. Por falta de segurança o trabalho foi suspenso.

Em 1996, a partir da publicação do Decreto 1775/96 que insere no procedimento demarcatório a possibilidade de contestação de pessoas físicas e jurídicas, a Agropecuaria Alto Turiaçu contestou a TI alegando que sua propriedade havia sido atingida. Entretanto, a contestação foi considerada improcedente pela Funai e pelo ministro Nelson Jobim.1

Assim, a TI Awá estende-se por cerca de 118.000 hectares, o que é menos da metade da área proposta originalmente em 1985. Cerca de 54 Awá contatados vivem em uma comunidade próxima ao posto da FUNAI chamado Juriti, e ocasionalmente Awá isolados têm sido vistos em outras partes do território.

Com a construção da estrada BR 222 na década de 1950, e a descoberta em 1967 de vastos depósitos de minério de ferro na Serra dos Carajás no estado do Pará e consequente instalação do Projeto Grande Carajás, parcialmente financiado pelo Banco Mundial e pela Comunidade Econômica Europeia, a ferrovia da mina até a costa oceânica, (porto da capital São Luís-MA), concluída em 1985, cortou diretamente a terra dos Awá.

As terras Awá se tornaram rapidamente acessíveis aos forasteiros, em particular, madeireiros podiam obter altos lucros com as madeiras de lei, fazendeiros e agricultores de pequena escala também prosperaram. Todos aproveitaram da evidente ausência de qualquer forma eficaz de aplicação da lei na região: a brutal opressão aos Awá, e mesmo seus assassinatos, ficaram impunes. Aqueles que não morreram pelas armas, muitas vezes, sucumbiram às doenças introduzidas, para as quais os Awá não tinham imunidade. A espoliação do patrimônio indígena foi incentivada por políticas governamentais em período remoto, porém ilegal por conta da constituição de 1988, vigente, e até mesmo das constituições anteriores, de 1967 e da emenda constitucional de 19692.

Em agosto de 2012 madeireiros começaram a convergir em direção à aldeia de Juriti, vindo de três direções diferentes. Em setembro de 2012, uma equipe da FUNAI e outros funcionários foram forçados a se retirar do Território por madeireiros armados. Poucos meses depois, em fevereiro de 2013, uns Awá de Juriti disseram à ong Survival que os madeireiros estavam agora a apenas 5 km de distância, e que eles já haviam marcado árvores a 3 km de distância.

Um declínio na taxa de desmatamento ao longo dos quatro anos anteriores ao registro da TI Awá – de cerca de 2.400 hectares em 2004 para apenas 16 hectares em 2008 – foi seguido em 2009 por um aumento de 375% em apenas 12 meses, resultando na perda de mais outros 6.000 hectares. O território alcançou a distinção de perder mais floresta em 2009 do que qualquer outro território indígena no país. Imagens de satélite capturadas em junho de 2010 mostram que, até essa data, cerca de 31% ou 37.000 hectares da TI Awá foram completamente desmatados. A zona tampão proposta em torno da TI foi ainda pior, perdendo 43% de sua cobertura florestal3.

Os mapas da FUNAI também identificam 3 grandes fazendas que têm desempenhado um papel importante na espoliação da TI Awá. A área desmatada pela Fazenda Caruturi aumentou de 240 hectares em 1991 para mais de 600 hectares em 1996, e para quase 1.000 hectares em 2010. Este dramático crescimento é explicado pela compra da fazenda em 1993 por um grande fabricante de parquet chamado INDUSPAR. A Fazenda Sampaio tem seguido um padrão parecido. Sob a propriedade de uma grande madeireira e serraria chamada Serraria Sampaio Ltda, uma área desmatada de pouco menos de 140 hectares em 2001, aumentou para mais de 5 vezes desse tamanho em 2010. Uma terceira fazenda pertence à Agropecuária Alto do Turiaçu Ltda, que ocupou 38.000 hectares de terra na TI Awá em 1985 e tem estado lá desde então. Esta empresa pertence ao Grupo Schahin, que opera nos setores de construção, imobiliário e outros setores com forte demanda por madeira.

A histeria da FAEMA em mobilizar setores à resistência4 tem ancoradouro, como já afirmamos, nos bilhões de reais que não serão mais acumulados pelo agronegócio com a matança dos Awás e a destruição da floresta. Conforme já afirmamos em recente artigo5, várias são as manobras para barrar a desintrusão da TI Awá. A sociedade brasileira deve está atenta permanentemente em cada manobra, que envolve parlamentares federais, prefeitos e governadores. Afinal, por trás de gritos inaudíveis, os grileiros, madeireiros e toda espécie de cupins destroçam a floresta e seus povos, numa verdadeira pilhagem bandeirante. Salvemos os Awás!

                                       Mapa de localização- TI Awá- Fonte: Instituto Sócio Ambiental


Diogo Cabral, 30 anos, advogado da FETAEMA e CPT/MA, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MA









1http://site-antigo.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=512
2http://www.cimi.org.br/pub/MA/Awa-Guaja/PETICAOAWA_03MAIO2013.pdf
3http://www.cimi.org.br/pub/MA/Awa-Guaja/PETICAOAWA_03MAIO2013.pdf
4http://www.questaoindigena.org/2013/12/moradores-de-sao-joao-do-caru-prometem.html

5http://diogodrcabral.blogspot.com.br/2013/12/salvemos-os-awas-das-garras-de-weverton.html

Engenho de flores, resiste!

Lavradores da comunidade Engenho, em São José de Ribamar, denunciam as atrocidades cometidas por pistoleiros e Tropa de Choque da PM, a mando do secretário de Estado Alberto Franco, despejaram e atiraram contra trabalhadores rurais. Ao centro da foto,o senhor Domingos, ameaçado de morte, ladeado pelos advogados da Fetaema Luís Antonio Pedrosa e Diogo Cabral.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

BALANÇO 2013 - Os descaminhos da Reforma Agrária- Comissão Pastoral da Terra - Regional Nordeste II

BALANÇO 2013 - Os descaminhos da Reforma Agrária

    


A Comissão Pastoral da Terra - Regional Nordeste II lança Balanço e avaliação da Reforma Agrária no ano de 2013.  Para conferir o texto na integra, leia abaixo:

O Estado brasileiro, por mais um ano, transformou os sonhos do Sem Terra e dos povos do campo em pesadelo. 2013 conseguiu ser ainda pior do que o ano anterior, que já registrava um dos piores índices da Reforma Agrária na história do país. Só após as muitas e exaustivas pressões dos movimentos sociais, a Presidenta Dilma Rousseff assinou, de última hora, decreto presidencial que desapropriou 92 áreas para a Reforma Agrária em todo o país.
Com as oito áreas que já haviam sido desapropriadas no mês de outubro, o ano de 2013 se encerra com cem desapropriações de Terras que poderão assentar menos de cinco mil famílias de trabalhadores e trabalhadoras rurais sem terra no Brasil. No entanto, estas famílias ainda terão que penar por mais alguns anos nos acampamentos até que ocorram as imissões de posses, em virtude da crítica lentidão na efetivação dos assentamentos, para a qual concorrem o Incra, o Ministério da Fazenda (TDA’s e créditos),  e o Poder Judiciário.
O número de famílias que poderão ser beneficiadas por estas desapropriações está muito distante da necessidade demandada pelos movimentos do campo, que afirmam ter no Brasil aproximadamente 200 mil famílias acampadas. Se continuar neste ritmo, o Governo Federal necessitará de mais 40 anos somente para zerar o atual passivo das famílias acampadas.

As recentes Medidas Provisórias anunciadas pelo Governo no fim de 2013 não deixaram dúvidas com relação à política de Reforma Agrária defendida pelo governo. Medidas que defendem a privatização dos assentamentos, a legalização da grilagem, a descentralização das políticas e o sepultamento do Incra, entre tantas outras que explicitam que é o Mercado quem regula o Estado na questão agrária e não o contrário, como determina a Constituição e como reivindicam os defensores da reforma agrária.
O Plano Nacional de Reforma Agrária, elaborado no início do Governo Lula, e até então nunca implementado, fica cada vez mais distante no horizonte das ações estatais. Vale salientar que tais medidas Anti-Reforma Agrária vem de muito longe, com o governo FHC, a partir da chamada “Reforma Agrária pelos correios”, do Banco da Terra, do Crédito Fundiário, da Medida Provisória que impede desapropriações em terras ocupadas por trabalhadores e trabalhadoras rurais.
Tais ações consolidam uma política de Estado de não-reforma agrária e que cria um mercado de terras para atender à demanda do capital no País e não a dos trabalhadores sem terras e do modelo sustentável que reivindicam.
Como se não bastasse, em 2013, as corporações internacionais avançaram a todo o vapor para controlar as terras brasileiras, a produção de alimentos e, assim, submeter o povo brasileiro à lógica do mercado e do capital internacional. O Brasil tornou-se um microcosmo deste projeto destrutivo e concentrador de desenvolvimento. A corrida pelo domínio da terra tornou os imóveis rurais o principal ativo econômico da atividade agrícola.
Com incentivos e apoios estatais, o Brasil vem assistindo a intensificação das dinâmicas de aquisição e dominação de novos territórios pelo capital e suas corporações. A expansão de empresas ligadas ao grande capital demonstra que a prioridade atual continua sendo a produção de monocultivos, criação de bovinos voltados para o mercado externo, atendendo à incessante demanda de expansão do cultivo de commodities e da mineração.

Violência no campo – O direito a vida também está sendo negado

Em 2013, os conflitos agrários no país estiveram hegemonicamente relacionados aos grandes projetos para estruturação e avanço do capital, como a construção de hidrelétricas, portos, mineradoras, obras da Copa, projetos de expansão do agronegócio, além de outras grandes obras de infraestrutura.
Esse contexto gerou vários conflitos territoriais que resultaram em intensas ações de violência e que tiveram grande repercussão nacional, envolvendo milhares de famílias camponesas e povos e comunidades tradicionais.
A título de exemplo, ressaltamos algumas dessas violências no Nordeste e em outras regiões brasileiras: o conflito territorial envolvendo milhares de famílias camponesas que resistem às violências desmedidas e cotidianas praticadas pelo Complexo Portuário de Suape, que através de uma série de ilegalidades e documentos fraudados, avança sob os territórios camponeses no litoral sul do Estado de Pernambuco; o Projeto de Irrigação da Chapada do Apodi, no Rio Grande do Norte, que revela a opção do Governo Federal em extinguir um dos territórios de convivência com o semiárido mais exemplares do Brasil, para beneficiar meia dúzia de grandes empresas do agronegócio. Ao Norte, no estado de Rondônia e no Pará, o conflito com povos indígenas em resistência às mineradoras e às hidrelétricas como a de Belo Monte e de Itapajó. No Centro-Oeste, em Mato Grosso do Sul, a resistência até as últimas consequências do povo indígena Guarani-Kaiowá em defesa de seu território. No Sul, os conflitos territoriais nos estados do Paraná e do Rio Grande do Sul, também envolvendo a defesa dos territórios indígenas contra a ofensiva dos ruralistas.

A perversidade deste modelo de desenvolvimento, implementado pelo Estado Brasileiro, e dos grandes projetos para estruturação e avanço do capital, tem ameaçado a vida no campo. Este modelo, para se viabilizar, precisa cada vez mais de terra, água e de biodiversidade, causando conflitos com as populações que vivem tradicionalmente nestes territórios. Dados parciais da Comissão Pastoral da Terra (CPT), para o ano de 2013, registram 697 casos de violências contra camponeses ou camponesas em conflitos territoriais, além de 108 ameaças de morte. A maioria concentra-se no Norte e Nordeste do País.

Povos Tradicionais – Continua sem se respeitar o lugar que é deles

Entre os casos de violências registrados parcialmente pela CPT em 2013, destacam-se os conflitos territoriais envolvendo as populações indígenas. Dos números parciais de assassinatos no campo em 2013, aproximadamente 50% das vítimas foram indígenas. As ações de mobilizações e retomadas de Terras Indígenas também foram as que mais se sobrepuseram em todo o país.
Em 2013, os povos originários sofreram todos os tipos de violência, desde ameaças, assassinatos, perseguições - provocadas pelos grandes latifundiários e empreendimentos do capital - até a violência praticada pelo próprio Estado Brasileiro, através da força policial, do Poder Judiciário e das portarias e decretos que limitam as demarcações dos territórios.
A relação de conflito envolvendo o Estado, o capital e as populações tradicionais revela que o país vive uma crise de destino. Nestes territórios tradicionais também se concretiza a luta de classes. A vida dos povos do campo, das florestas e das águas está relacionada à possibilidade de permanência nestes territórios. São neles que se praticam as mais diversas formas milenares de saberes e fazeres de maneira entrelaçada com a natureza. A apropriação dos territórios camponeses e indígenas pelo capital representa a morte física e cultural, material e simbólica de nossas raízes e da possibilidade de Vida para as futuras gerações.

Transgênicos e Agrotóxicos: Aumenta o veneno em nossa mesa

Ainda em 2013, a atuação do Governo Federal em relação à liberação de sementes transgênicas permaneceu vergonhosa. O país mostrou que, cada vez mais, segue refém dos interesses de empresas transnacionais, como a Monsanto, a Sygenta, Bunge, entre outras. Este fato explicita que o Governo Brasileiro coloca em jogo a soberania alimentar de seu próprio país, aniquilando o direito dos agricultores e agricultoras de cultivarem suas próprias sementes e de levarem comida saudável para a mesa do povo brasileiro.
Com relação aos agrotóxicos, a tendência de uso intensivo permaneceu em 2013. De acordo com dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (Sindag), o mercado brasileiro de agrotóxicos movimentou, só em 2012, US$ 9,7 bilhões. Hoje, o país já é responsável por 20% de todos os venenos despejados na agricultura no mundo. Atualmente, a avaliação dos agrotóxicos seria um dever conjunto do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Tais órgãos deveriam avaliar a eficiência agronômica do produto, os efeitos à saúde humana e conferir os impactos ambientais, respectivamente.
Visando a elevação ainda mais significativa do comércio de agrotóxicos, o agronegócio agora opera para promover o desmonte desse controle Estatal, já considerado ineficiente e frágil. Grandes Corporações, com apoio da bancada ruralista, defendem a criação de uma nova Comissão, formada por 13 a 16 membros, sem a participação da ANVISA e do IBAMA e subordinada à Casa Civil, que assumiria a função de deliberar sobre a aprovação ou não do registro de um determinado agrotóxico.

Trabalho escravo: De Volta à Casa Grande

A conjuntura de 2013 traz o ano todo a ofensiva ininterrupta dos ruralistas contra o conceito de trabalho escravo. O Projeto de Lei Constitucional PEC 57-A/99, aprovado na Câmara dos Deputados em 2012, possibilita a expropriação das propriedades urbanas e rurais onde for localizada a prática do trabalho escravo. A medida foi apoiada por diversas entidades da sociedade civil.
No segundo semestre de 2013, por manobra da bancada ruralista, passou-se a exigir uma revisão do conceito de trabalho escravo. Os ruralistas querem restringir a definição do Trabalho Escravo às formas de exploração que remetem às condições de trabalho escravo do século XVI, como o trabalho acorrentado e chicoteado. A ação intencional visa desconsiderar as características da escravidão moderna (jornada exaustiva, condições degradantes, etc).
A bancada ruralista, que sempre esteve contrária ao confisco da propriedade, quer impor suas condições da definição de trabalho escravo do jeito que lhe convém, através da proposta de Lei (PLS 432) do senador Romero Jucá. A regulamentação proposta pelo mencionado senador, visando atender ao interesse dos grandes proprietários, retira toda eficácia da PEC do Trabalho Escravo, contribuindo, assim, para que esta prática continue sendo comum no Brasil. Os ruralistas querem a volta da Casa Grande e de suas práticas desumanas, para que os escravagistas voltem a reinar, agora com o nome de agronegócio.

Lutas que marcaram 2013

Mesmo diante de todas as dificuldades impostas pelo Estado e pelo agronegócio, os camponeses e camponesas continuaram lutando pela Reforma Agrária, pelos seus territórios tradicionalmente ocupados e seguiram resistindo ao avanço do latifúndio, do agronegócio e das corporações.  
Algumas destas grandes mobilizações marcaram este ano que se encerra, como a jornada das mulheres da Via Campesina, realizada em março e que mobilizou mais de 10 mil camponesas em todo o país para exigir o assentamento das 200 mil famílias acampadas. Outra frente importante foi a das  mulheres que, em defesa de direitos e de um novo modelo socio-econômico-ambiental para o Campo,  organizaram, em vários estados brasileiros, ocupações de terras, de empresas de agrotóxicos, de Usinas de cana de açúcar, de prédios públicos, além da realização de marchas e bloqueio de rodovias.
Também no mês de março, relembramos o início do acampamento da Via Campesina, realizado em Brasília e que durou três meses. Neste período, foram realizadas marchas, ocupações de Ministérios, além de manifestações e atos políticos.
Ainda em março, por ocasião do dia Internacional de lutas contra as barragens, pelos rios, pela água e pela vida, o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB) organizou jornadas de lutas nacional com o objetivo de fortalecer o apelo pela defesa dos rios, da água e da vida.
Em abril, o MST organizou sua jornada de caráter nacional, com mobilizações em 19 estados, além do Distrito Federal. Foram mais ocupações de terras e mobilizações em prédios públicos, prefeituras e realização de marchas em todo o país.
Em abril também foi realizado a 11ª edição do Abril Indígena ou Acampamento Terra Livre, que representou um passo significativo para denunciar e tornar mais visível a situação de violência em que vivem os povos indígenas em todo o país,  principalmente as praticadas pelo próprio Estado brasileiro. Cerca de 700 indígenas ocuparam o plenário da Câmara dos Deputados, produzindo uma imagem marcante que rodou o país e o mundo, onde os deputados corriam apavorados diante da investida pacífica dos indígenas, que exigiam a suspensão da PEC 215, referente a mudanças na competência de demarcação de seus territórios.
O movimento sindical também ocupou as ruas em 2013, a exemplo da realização de mais uma edição do Grito da Terra, realizado em Brasília no mês de maio. A mobilização nacional, que reuniu milhares de trabalhadores e trabalhadoras rurais, foi precedida de um conjunto de manifestações estaduais e regionais.

Nos meses de junho e julho, as organizações que atuam no campo se somaram às dezenas de manifestações populares que emergiram em diversas cidades do país. Os povos do campo saíram as ruas de inúmeras cidades do país, trancaram rodovias, ocuparam prefeituras e órgãos públicos para exigir e colocar em pauta a necessidade urgente da realização de uma ampla Reforma Agrária.
Em outubro, as mobilizações ocorreram em torno da Jornada Unitária por Soberania Alimentar. Na ocasião, os povos do campo, mais uma vez, promoveram um conjunto de ações e mobilizações, como marchas, ocupações de terras e de prédios públicos.
O ano de 2013 também destacou-se pela luta para a regularização dos territórios pesqueiros no país. Embora seja uma atividade milenar, os pescadores e as pescadoras artesanais não possuem normativas que assegurem os seus territórios. A pesca artesanal, grande celeiro de alimentos, que produz 70% do pescado no Brasil, está sendo ameaçada pelos grandes empreendimentos em torno dos portos, da especulação imobiliária, e pela degradação dos ambientes costeiros e das águas interioranas.
Estamos todos e todas convocados a caminharmos  firmes como quem enxerga o invisível.
A luta pela Terra e pelo território, historicamente defendida pelos movimentos sociais e necessária para transformar verdadeiramente a estrutura fundiária e de poder no país, não existe no horizonte do Estado brasileiro. Este, por seu turno, desde sua constituição, caminhou ao lado do latifúndio, do agronegócio e do capital. As forças conservadoras utilizam a mídia e outros aparelhos ideológicos existentes para anunciar a falsa ideia de que o agronegócio e o desenvolvimentismo são as únicas possibilidades históricas para o campo brasileiro.

Os diversos povos da terra e das águas encontram-se em pleno processo de genocídio e de extinção. Cabe a eles assumir a responsabilidade da realização da Reforma Agrária e da conquista de seus territórios. Frente a este cenário, acreditamos na mística dos povos, na sua força e na capacidade criativa nas lutas e resistências. Às organizações sociais e à sociedade cabe mergulhar nas correntezas subterrâneas e ouvir os clamores que vem das Terras, das florestas e das águas.

Fonte: http://www.cptnacional.org.br/index.php/publicacoes-2/noticias-2/12-conflitos/1867-balanco-2013-os-descaminhos-da-reforma-agraria